Autor(es): José Márcio
O Estado de S. Paulo - 18/01/2010
Pesquisas recentes mostram que a taxa de retorno da educação no Brasil é bastante alta, entre 11% e 15% ao ano. Ou seja, um ano adicional de estudo aumenta a renda entre 11% e 15% ao ano ao longo de toda a vida útil da pessoa. Por outro lado, o Brasil é um dos países com maior desigualdade na distribuição de renda no mundo. Os 10% mais ricos da população brasileira se apropriam de quase 50% da renda gerada no País.
A desigualdade na distribuição da renda é o resultado de um processo. A renda de uma pessoa depende de sua capacidade de gerar riqueza para as empresas e para a sociedade, ou seja, de sua produtividade. Em média, quanto maior a produtividade, maior a renda. Algumas pessoas podem já nascer ricas e viver dos resultados de aplicações financeiras. Mas elas são exceções. Em geral, as pessoas trabalham, são remuneradas e poupam parte dessa remuneração. Portanto, desconsiderando transferências de renda entre pessoas, com ou sem a intermediação do governo, a distribuição da renda numa sociedade reflete a distribuição da produtividade de seus membros.
A produtividade das pessoas depende fundamentalmente de três variáveis. Primeiro, de suas capacidades inatas. As pessoas nascem diferentes entre si e essas diferenças afetam sua capacidade de gerar riqueza. Segundo, das oportunidades que lhe são oferecidas ao longo da vida, o que é basicamente determinado pelo acesso à informação e ao conhecimento, ou seja, pelo estoque de capital humano (educação). Terceiro, das escolhas pessoais. Algumas pessoas escolhem se dedicar a atividades que a sociedade considera, corretamente ou não, menos (mais) produtivas e, portanto, valoriza menos (mais) do que outras.
Dessas três variáveis, a que melhor pode ser influenciada por medidas de política é o acesso à informação e ao conhecimento. Ou seja, a acumulação de capital humano. A acumulação de capital humano depende de duas variáveis. Primeiro, da quantidade de investimento, em termos de tempo e recursos, realizada pelas pessoas. Segundo, da qualidade da educação oferecida pelo sistema educacional. O problema é que essas duas variáveis estão, em geral, diretamente relacionadas ao nível de renda das pessoas ou de suas famílias.
Crianças de famílias pobres precisam entrar mais cedo no mercado de trabalho para ajudar na renda familiar e dedicam menos tempo e menos recursos para acumular capital humano. Portanto, para que o acesso à educação seja igualitário, é necessário que a sociedade pague para que as crianças das famílias pobres permaneçam na escola. Caso contrário, as famílias pobres irão, em média, investir menos na educação de seus filhos do que as famílias ricas, perpetuando a desigualdade de oportunidades e de renda. Este é o objetivo de programas como o Bolsa-Escola e o Bolsa-Família, que foram instrumentos importantes para universalizar o acesso à educação no Brasil nos últimos 15 anos.
Porém, somente acesso ao sistema educacional não é suficiente para tornar a distribuição de oportunidades mais igualitária. Além de acesso, é necessário que a distribuição da qualidade da educação oferecida pelo sistema educacional seja também igualitária. Ou seja, que pobres e ricos tenham acesso a escolas de qualidade similar. E o Brasil tem feito muito pouco para atingir esse objetivo.
Em média, a qualidade das escolas privadas é maior que a qualidade das escolas públicas. Como os pobres não têm acesso às escolas privadas, em razão da falta de recursos, a qualidade da educação oferecida aos pobres é menor que a da educação oferecida aos ricos. Esse problema se agrava por causa do fato de que as famílias pobres têm menos acesso a informações, o que deveria ser compensado pelo sistema escolar. O resultado é a perpetuação da desigualdade na distribuição de oportunidades.
Após a universalização do acesso à educação, em lugar de investir na redução da desigualdade da distribuição da qualidade do sistema educacional, o Brasil adotou políticas de transferência de renda (pensões, aposentadorias, aumentos do salário mínimo, etc.) como instrumentos de redução da desigualdade na distribuição da renda. Essa estratégia é justificável para reduzir as desigualdades de renda decorrentes de diferenças inatas das pessoas, caso isso seja considerado socialmente justo.
Mas é uma estratégia voltada para o curto prazo, pois não gera ganhos de produtividade, não cria incentivos ao crescimento e não diminui a desigualdade de oportunidades na economia. Ao contrário, como essas políticas somente são financiáveis por meio da taxação dos mais ricos, que, como vimos, são em média os mais produtivos, e sendo os recursos assim obtidos utilizados para financiar as transferências de renda aos mais pobres, o resultado é menos incentivo a investimento em capital humano e, portanto, a ganhos de produtividade e ao esforço. Ao mesmo tempo, a desigualdade na distribuição de oportunidades, que é a causa estrutural da desigualdade na distribuição da renda, permanece intocada, reproduzindo a desigualdade.
Clipping Bem Fam(18/10)
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