O POVO é censurado por liminar
Informações censuradas estão disponíveis no site da Justiça Federal
O POVO está sob o baque de uma censura prévia. Na noite da última quinta-feira, 19 de março, pouco depois das 22 horas, quando o plantão de feriado de São José já estava quase concluído e o fechamento da edição seguia nos momentos finais, a Redação do jornal recebeu a visita de uma oficial de justiça com uma liminar que proibia previamente a publicação de uma matéria, sob pena de o jornal ser multado diariamente em R$ 10 mil. A decisão, que ainda vigora e abrange também outras mídias do Grupo de Comunicação O POVO (rádios, TV e Internet), foi assinada pelo juiz plantonista Benedito Helder Afonso Ibiapina, da 16ª Vara Cível. Cercear o dever de informar fere a liberdade de imprensa e de expressão, princípios básicos da Constituição Federal.
A matéria seria publicada na edição de hoje e informaria sobre movimentações financeiras bloqueadas pela Justiça Federal, numa operação da Polícia Federal contra o jogo do bicho. Em sua decisão, o juiz estadual atendeu a uma ação cautelar inominada movida por advogados de um empresário local, que alegou estar sofrendo risco de ter seu sigilo bancário quebrado pela reportagem. O curioso é que os detalhes do despacho judicial federal que O POVO se encontra impedido de publicar estão disponibilizados, oficialmente, desde a manhã de ontem, no site da Justiça Federal e podem ser acessados em qualquer parte do mundo, mas não podem ser publicados como matéria jornalística.
Ao contrário do que considerou o juiz da 16ª Vara Cível, o caso manteve-se sob sigilo apenas durante a investigação policial. Atualmente, a ação penal vigente não tem nenhum segredo decretado, segundo a Justiça Federal. No final da tarde de ontem, O POVO tentou ouvir o juiz Benedito Helder Afonso Ibiapina. Na 16ª Vara, a informação foi de que ele já havia deixado o Fórum. Em outros dois telefones obtidos, os familiares não souberam informar como localizá-lo.
Na secretaria da 16ª Vara, a informação dada foi de que o processo será remetido na próxima semana para a 23ª Vara Cível, para onde foi distribuído. Até ontem à tarde, continuava sem numeração processual informada, segundo o advogado do O POVO, Décio Rocha. O jornal recebeu cinco dias de prazo para recorrer da liminar. Procurado, numa primeira ligação o advogado do empresário atendeu, às 18h02min, e disse que retornasse uma hora depois. No horário combinado, em três tentativas num intervalo de 15 minutos, seu telefone chamou e não foi atendido. No escritório, a informação foi a de que ele já havia deixado o local.
Ontem, a Associação Nacional de Jornais (ANJ), através do Comitê de Liberdade de Expressão, condenou a decisão que censurou O POVO previamente e emitiu nota (publicada nesta página). “A ANJ entende que em casos como esse o segredo de justiça se aplica às partes, mas não pode ser utilizado como justificativa para cerceamento da liberdade de imprensa, que é dispositivo constitucional federal”, afirmou a assessoria de imprensa da entidade. Para a ombudsman emérita do O POVO, jornalista Adísia Sá, o jornalista que fez a matéria e a empresa jornalística estão sendo cerceados no ofício de informar.
Adísia cita principalmente o artigo 220 da Constituição Federal: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”. No parágrafo 1º, o mesmo artigo diz que “nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social”. No artigo 5º da Constituição, está especificado (no item XIV): “É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.
E mais
- Recente caso emblemático de censura na imprensa brasileira ocorreu em junho de 2008, com o Jornal da Tarde, de São Paulo. Na ocasião, o veículo publicaria uma reportagem sobre supostas irregularidades cometidas pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) na capital paulista. A liminar que proibiu a matéria foi concedida pela 10ª Vara Cível de São Paulo e classificada como “censura prévia” pela Associação Nacional de Jornais (ANJ). A proibição da reportagem contra o CRM durou seis dias. No dia 30 de junho, o juiz substituto da 10ª Vara da Justiça Federal de São Paulo, Danilo Vieira dos Santos, extinguiu a ação contra o Jornal da Tarde. A matéria, assinada pelo jornalista Felipe Grande, foi publicada no dia seguinte - 1º de julho - e trazia parecer do Tribunal de Contas da União (TCM) que questionava a compra, aluguel e reforma de imóveis sem licitação.
O Povo online – 21/03/2009
23/03/2009
Fonte:ww.anj.org.br/sala-de-impensa/
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