Polícia e Anvisa querem identificar pontos de venda e rota dos medicamentos
Carlos Carone e Francisco Dutra
A Polícia Civil do Distrito Federal e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estão realizando uma ampla investigação para identificar todos os pontos de venda de medicamentos irregulares, incluindo os abortivos, como o Cytotec. A confirmação surgiu poucas horas após reportagem do Jornal de Brasília, publicada na edição de ontem, revelar o comércio criminoso de abortivos na Feira dos Importados.
Sem confirmar detalhes do levantamento, a delegada-chefe da Delegacia do Consumidor (Decon), Suzana Machado, afirmou que as autoridades estão próximas de determinar a fonte dos medicamentos e o caminho que eles percorrem até chegar ao DF. "Existe um canal usado pelos traficantes que utilizam ônibus interestaduais para trazer a droga. Esses medicamentos deixam a Ciudad del Leste, no Paraguai, e entram no País por Foz do Iguaçu, no Paraná", disse a delegada.
Outra preocupação é sobre a forma com que os medicamentos chegam ao DF. "Não sabemos as condições em que esses medicamentos são transportados. Se são expostos a químicos, ao sol, à chuva, a bactérias ou a fungos. Isso pode tornar seu uso irregular ainda mais perigoso para as mulheres. Esse é um gravíssimo problema de saúde pública", comenta o chefe do Departamento de Inteligência da Anvisa, Adilson Batista.
No combate à venda de medicamentos, tanto na Feira dos Importados quanto em outros pontos do DF, como pequenas farmácias nas cidades de Ceilândia e Planaltina, Bezerra afirma que os traficantes não costumam esconder os remédios em apenas um lugar para dificultar uma possível apreensão. "Esses criminosos carregam sempre pequenas doses dos medicamentos e costumam trabalhar sob encomenda", explicou o chefe da Inteligência do órgão.
Para realizar a transação e flagrar o comércio do Cytotec na Feira dos Importados, a reportagem do JBrman teve, durante uma semana, contato com um dos homens responsáveis pela venda nos estacionamentos da feira, tudo com o conhecimento da Decon e do Ministério Público. Nos primeiros momentos, o homem se mostrou muito desconfiado e disse que não teria o medicamento para vender de imediato. As conversas continuaram por telefone. No decorrer dos contatos, foi notado que ele faz a ponte com outro homem que transporta o Cytotec.
No dia da transação, o guardador de carros e o homem que tinha o medicamento foram até a equipe de reportagem em um estacionamento mais afastado, próximo da área de desembarque dos caminhões que abastecem a Ceasa. A venda foi rápida. "Sua namorada está com quantos meses? Dá as pílulas que ela resolve isso rapidinho. Ela tem que estar com a barriga vazia, antes de tomar", disse o traficante, sumindo por entre os carros.
Rotina perigosa
Acelerado pela venda crescente de medicamentos ilegais, como o Cytotec, o aborto se tornou uma rotina perigosa nos lares brasileiros. Segundo a Pesquisa Nacional de Aborto (PNA), a cada cinco mulheres com até 40 anos pelo menos uma já fez aborto. Sem acompanhamento médico e usando remédios de eficácia e procedência duvidosa, metade dessas mulheres foi internada vítima de graves complicações após o aborto
Segundo a professora da Universidade de Brasília (UnB) e responsável pela PNA, Debora Diniz, o perfil dessas mulheres está muito distante da imagem de jovens adolescentes sem experiência de vida. "A mulher que faz aborto ilegal tem 25 anos e é casada", aponta a especialista. De fato, o aborto ocorre no auge do período reprodutivo feminino, que vai dos 18 até os 29 anos.
Traição, falta de recursos. Por diferentes razões, estas mulheres optaram por não levar a gravidez à frente, a despeito dos riscos legais e de saúde. Mas o raios X desse drama revela que o fator educação também é determinante. Quanto menor for a taxa de escolaridade, maior é a incidência de abortos.
Em síntese, o perfil da mulher que já fez um aborto se encaixa facilmente com o perfil da mãe, da colega de trabalho, ou mesmo da vizinha de qualquer pessoa, em qualquer Região Administrativa do DF. Por isso, para a pesquisadora Debora Diniz, a sociedade precisa rever seu posicionamento diante da controversa prática o quanto antes.
"Você tem dois caminhos. Ou aumenta a repressão e o combate à venda ilegal ou abre a questão para o debate dentro da sociedade sobre a legalização do aborto. A Organização Mundial da Saúde (OMS), inclusive, reconhece o Cytotec como um abortivo eficaz. Em outros países, o aborto é legalizado e médicos acompanham o uso para garantir a saúde das mulheres. O que não podemos admitir é que o problema continue como está. As mulheres arriscam suas vidas usando medicamentos de origem duvidosa, sem acompanhamento, correndo risco de morte", comenta a especialista.
ENQUETE
O que você acha da fácil compra e venda de abortivos no Distrito Federal?
"É extremamente errado, porque é uma vida que se está tirando. Se a pessoa começou a fazer, por que não se preveniu antes? A pessoa que faz um aborto é muito ignorante"
Anderson de Souza, 32 anos, assistente administrativo
"Falta fiscalização, com certeza. Também falta fiscalização nas fronteiras do Brasil. É por elas que entram esses remédios e outras coisas ilegais. Há um deficit de pessoas para isso"
Danielle Melo, 22 anos, auxiliar de pessoal
"Isso é falta de fiscalização da Anvisa. Também é falta de informação dos efeitos colaterais desses remédios. As pessoas compram como se fossem analgésicos"
Marinete Gonçalves, 45 anos, servidora pública
"Eu acho errado, porque é uma ameaça à vida das pessoas. É um remédio perigoso e uma criança pode comprar isso facilmente. Sou contra o aborto"
Cortesia: Clipping Bem Fam(07/07/010)
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