Combate ao HIV e aids ganha destaque na visita de Hillary Clinton ao Brasil
Agência de Notícias da Aids
05/03/2010
“A ação da secretária de Estado dos EUA tem sido fundamental para refinar as estratégias de enfrentamento e garantir advocacy efetivo para grupos específicos, como a comunidade de homossexuais”, disse a coordenadora do Departamento de Aids da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID) no Brasil, Lena Lentini, em entrevista à Agência Aids
A secretária de Estado norte-americano, Hillary Clinton, esteve no Brasil entre os dias 2 e 3 de março. Durante sua estada em Brasília, ela se reuniu com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim e com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Alguns temas abordados durante a visita de Hillary em Brasília foram o programa nuclear do Irã; a atuação do Brasil no Haiti; o novo governo de Honduras, além de questões relacionadas à cooperação econômica e ao combate da aids.
Este último ganhou espaço nas reuniões, segundo o Ministério das Relações Exteriores, devido a um programa trilateral (Brasil, EUA e Moçambique) para apoiar o enfrentamento da epidemia no país africano, onde para cada seis adultos, aproximadamente um tem HIV.
Engajada no combate da aids, Hillary - quando senadora durante o governo de George W. Bush - criticou a estratégia defendida pelo ex-presidente de priorizar a abstinência como prevenção do HIV.
Os ideais conservadores da política Bush também ganharam notoriedade no Brasil, quando em 2005 o governo brasileiro recusou apoio de 40 milhões de dólares da Agência Norte-Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID), que não aceitou financiar projetos que reconheciam formalmente o trabalho do sexo.
Na época, vários ativistas elogiaram a posição brasileira e criticaram a USAID, argumentando que o requisito refletia um viés moralista inaceitável e contraproducente em termos de saúde pública.
Hoje, o governo de Barack Obama, influenciado por Hillary na área da aids, já mostra melhores atitudes contra a epidemia, como o cancelamento da proibição de visitas de estrangeiros soropositivos nos EUA.
Lena Lentini, coordenadora do Departamento de Aids da USAID no Brasil, explica que a principal mudança no apoio dos Estados Unidos para o enfrentamento mundial do HIV e da aids é dar mais atenção à capacidade local para o enfrentamento da epidemia e nas abordagens multissetoriais definidas pelos próprios governos dos países.
Quanto ao apoio da Hillary, Lentini disse que a ação da secretária “tem sido fundamental para refinar as estratégias de enfrentamento e garantir advocacy efetivo para grupos específicos, como a comunidade de homossexuais”.
A coordenadora do Departamento de Aids da USAID no Brasil respondeu algumas perguntas feitas por email pela Agência de Notícias da Aids. Leia na íntegra:
Agência Aids - O que mais mudou na atual política internacional dos EUA de luta contra aids em comparação ao último governo?
Lena Lentini - O compromisso do governo dos EUA para enfrentar a epidemia de HIV/Aids em todo o mundo tem sido significativo e contínuo, perpassando todos os governos desde 1986, quando foi lançada a primeira estratégia de USAID de combate à epidemia. Em 2003, este compromisso foi renovado com o lançamento do Programa PEPFAR (Iniciativa Presidencial de Enfrentamento Emergencial à AIDS), que aplicou US$18 bilhões em programas de prevenção, tratamento e cuidados para portadores do HIV em todo o mundo. Em 2008, o governo dos EUA autorizou novamente o programa PEPFAR com um novo aporte de US$48 bilhões, ao mesmo tempo em que expandiu o alcance do programa para incluir o combate à tuberculose e à malária. Até 2009, o Programa ofereceu tratamento a 2,4 milhões de pessoas, cuidados domiciliares a 10 milhões, incluindo 4 milhões de crianças, e distribuiu 2,2 bilhões de preservativos nos países apoiados.
Em 2009, já durante a administração Obama, foi lançada a estratégia do PEPFAR para o período 2009-2013. A principal inovação desta estratégia é concentrar a assistência na construção de capacidade local para o enfrentamento à epidemia e no fortalecimento dos sistemas de saúde como um todo, por meio de abordagens multissetoriais definidas pelos governos dos países parceiros e do combate à aids no contexto global de saúde e desenvolvimento.
Outro avanço recente foi a suspensão da política que restringia a entrada de soropositivos nos EUA. Um resultado imediato desta medida foi o anúncio da realização da XIX Conferência Internacional de AIDS em Washington, em 2012. Esta será a primeira vez que os EUA receberão uma conferência internacional nessa área.
Agência – Existem projetos que hoje são apoiados pela USAID no Brasil, mas que no antigo governo tinham dificuldades de receber apoio?
Lentini - Os programas que a USAID apoia atualmente no Brasil foram iniciados em 2007 e, como tal, não podem ser atribuídos a um ou a outro governo. São programas desenhados em colaboração com o Departamento Nacional de HIV/AIDS (do Brasil) e têm dois objetivos principais: em primeiro lugar, aumentar o acesso de gays, lésbicas, travestis e homens que fazem sexo com homens ao aconselhamento e testagem, por meio da realização do teste rápido e da oferta de serviços, pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, em espaços como ONGs LGBT e unidades móveis que atuam em locais de concentração destas populações. O segundo objetivo é promover a inclusão social e econômica de pessoas vivendo com o HIV, garantindo a oferta de apoio psicossocial, promovendo a redução do estigma e facilitando o acesso à formação profissional.
Agência - Como a USAID vê a política ABC (Abstinência, Fidelidade e se necessário o Uso do preservativo) para a prevenção do HIV?
Lentini A USAID não é a única Agência do Governo dos EUA para a implantação de programas de enfrentamento ao HIV. O PEPFAR utiliza as competências e vantagens comparativas de várias agências do governo, entre elas a USAID, o CDC e o Departamento de Estado, para implementar estratégias integradas de prevenção. Tais estratégias são definidas em conjunto com os governos dos países parceiros, e procuram incluir um amplo leque de abordagens capazes de diminuir as taxas de infecção. Nessa área, o governo dos EUA tem investido recursos técnicos e financeiros no apoio a intervenções direcionadas a sub-populações que concentram a maioria dos novos casos. Entre as iniciativas apoiadas, encontram-se programas de aconselhamento e testagem, prevenção da transmissão vertical, informação, educação e comunicação, e estudos sobre a eficácia e o impacto de práticas inovadoras de prevenção. Portanto, a visão do governo dos EUA não se guia por uma única política, mas busca apoiar estratégias combinadas, baseadas em dados, para aumentar a eficácia da prevenção.
Agência - O fato da Hillary Clinton, que foi uma senadora atuante na luta contra a aids, ser agora secretária de Estado ajuda no apoio dos EUA na luta contra essa pandemia?
Lentini - A atuação da Secretária de Estado dos EUA reflete sua contínua preocupação com o aumento e a eficácia das políticas de combate ao HIV. No nível doméstico, sua ação tem sido fundamental para refinar as estratégias de enfrentamento e garantir advocacy efetivo para grupos específicos, como a comunidade LGBT. No campo internacional, a Secretária tem estabelecido importantes parcerias com vários governos. Como exemplo, sua visita ao Brasil tem como um dos principais itens da agenda a cooperação entre Brasil e Estados Unidos para fortalecer as respostas à epidemia de HIV/AIDS em países de língua portuguesa na África. Esta iniciativa conta com o apoio do Ministério da Saúde e da Agência Brasileira de Cooperação, e representa um novo modelo de cooperação no qual os países envolvidos contribuem recursos técnicos e financeiros para construir capacidade local e para adaptar experiências bem sucedidas de prevenção, tratamento, cuidados, logística e distribuição de insumos e fortalecimento de sistemas, dentro de um processo de colaboração horizontal, onde a contribuição de todos os parceiros é igualmente valorizada. O primeiro país africano a receber assistência conjunta será Moçambique. Há também espaço para a discussão de programas trilaterais de apoio à reconstrução do Haiti.
Agência - Quais são as prioridades atuais da USAID no Brasil?
Lentini - Na área da saúde, a USAID prioriza o trabalho com o Ministério da Saúde para diminuir as taxas de infecção por HIV e fornecer apoio psicossocial para a inclusão social e econômica das pessoas vivendo com o vírus, além de trabalhar com o Programa Nacional de Tuberculose para aumentar as taxas de cura entre as populações afetadas e prevenir a infecção por malária em regiões selecionadas. Outras prioridades são a conservação ambiental e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas; a promoção do uso de energia limpa e renovável; a preparação de jovens para o mercado formal de trabalho; e parcerias com o setor privado para a maximização de programas de responsabilidade social corporativa.
Agência – Alguns jornais voltaram a destacar recentemente o braço de ferro entre o governo brasileiro e os laboratórios norte-americanos acerca da propriedade intelectual dos medicamentos. Como a USAID vê a questão da licença compulsória dos medicamentos contra a aids?
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