Para ativistas, plano de enfrentamento das DST e aids em mulheres não teve integração e orçamento
08/03/2010
A primeira versão do Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de Aids e outras DST foi publicada em 2007 e tinha até 2010 como prazo para o cumprimento das metas, segundo o comunicado de imprensa divulgado pelo Ministério da Saúde na época.
No entanto, até o momento, só metade das metas foi cumprida.
“O primeiro plano, de fato, apresentava algumas distorções com algumas metas que foram estabelecidas. Esse processo de revisão também serviu para readequar e colocar nos devidos lugares aquilo que a gente tem hoje na área de política de mulheres”, disse o diretor-adjunto de Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Eduardo Barbosa.
No total, o plano estipulou 12 metas, sendo nove sob a tutela do Departamento de DST e Aids e três da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM).
O Departamento de Aids informa que cumpriu integralmente apenas quatro das metas sobre a sua responsabilidade.
Já a Secretaria para as Mulheres, apesar da equipe de reportagem da Agência Aids estar solicitando informações sobre o plano deste o dia 2 de março, até o momento nem se pronunciou a respeito.
Em entrevista (leia aqui),Eduardo Barbosa justificou que, na época de elaboração do plano, as metas não foram muito bem estabelecidas.
“Um exemplo é em relação à escola. Você tem lá que é para ampliar de 17 para 50% as escolas da rede pública que disponibilizam preservativos. Essa era uma meta que seria irreal porque no momento da concessão do plano a gente não tinha 17 por cento das escolas disponibilizando camisinhas.”
Ativistas criticam, entretanto, a execução do plano principalmente pela falta de integração com outros setores, como era a proposta original.
“O plano nunca aconteceu de fato. Quem acabou assumindo exclusivamente as responsabilidades foram o Departamento (de DST e Aids) e as coordenações estaduais dos programas de aids. Se for para ser assim, não precisava de plano”, disse a ativista Nair Brito que foi uma das consultoras do processo de criação do plano.
Nair criticou ainda o fato de que as pactuações entre diferentes instâncias nos governos não previam orçamento específico para as ações propostas no plano, o que gerou esquecimento.
Veja a seguir as metas e as respostas do Departamento de DST/Aids
1. Ter reduzido, até 2008, a taxa da transmissão vertical do HIV de 4% para menos de 1%;
Resposta: A nova versão do estudo que mede a taxa de transmissão vertical do HIV e da sífilis (Sentinela Parturientes) será realizada este ano, por isso ainda não é possível mensurar o avanço dessas metas.
2. Ter eliminado a sífilis congênita;
Resposta: Também depende do estudo Sentinela Parturientes. Entretanto, a sífilis congênita ainda é uma realidade no Brasil. No estado de Pernambuco, por exemplo, em 2009 para cada mil bebês nascidos vivos, 2,1 tinham sífilis congênita, conforme apurou a Agência Aids.
3. Ter integrado em 100% a rede básica de atenção integral para mulheres em situação de violência doméstica e sexual;
4. Ter implementado em 100% dos municípios que têm a política de incentivo no âmbito dos Programas de DST e Aids e Saúde da Mulher, ações de enfrentamento da violência sexual e doméstica;
5. Ter ampliado as redes de atenção às pessoas em situação de violência sexual e doméstica em 100% dos municípios prioritários.
Resposta: As três metas são de responsabilidade da Secretaria para as Mulheres, que ainda não se pronunciou.
6. Ter aumentado de 90,2% para 95% a proporção de mulheres que relatam espontaneamente a relação sexual como forma de transmissão do HIV (PCAP,2004);
Resposta: Meta cumprida, segundo PCAP 2008.
7. Ter aumentado de 35% para 70% a proporção de mulheres que relatam já terem sido testadas para o HIV; (PCAP, 2004);
Resposta: 48,7% das mulheres já realizaram teste de HIV (PCAP 2008).
8. Ter aumentado de 70% para 90% a proporção de mulheres que referem ter realizados exames ginecológicos como método preventivo nos últimos 3 anos (PCAP,2004);
Resposta: Cerca de 70% das mulheres realizaram exames ginecológicos como método preventivo nos últimos 3 anos (PCAP 2008).
9. Ter aumentado de 17% para 50% o número de escolas de ensino médio da rede pública que disponibilizam preservativos (Censo Escolar, 2005);
Resposta: As amostras dos dois censos são diferentes (a de 2005 é maior), por isso não são comparáveis. O que podemos dizer é que, em 2005, 7,6 mil escolas que trabalhavam com o tema DST e aids declararam distribuir preservativos. Em 2007, foram 9,7 mil (27,6% de aumento). Entretanto, o diretor-adjunto do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, Eduardo Barbosa, declarou que “essa era uma meta que seria irreal porque, no momento da concessão do plano, não tinha 17% das escolas disponibilizando camisinhas”.
10. Ter estabelecido linha de base para diagnóstico e ampliação do conhecimento sobre sexualidade e reprodução em mulheres vivendo com HIV/aids;
11 Ter estabelecido uma linha de base para diagnóstico e ampliação do conhecimento sobre a prevalência de DST em mulheres;
Respostas para as metas 10 e 11: A PCAP 2008 trouxe dados sobre sinais e sintomas de DST na população brasileira. Além disso, em 2008 foi divulgado um estudo de prevalência de DST em seis capitais brasileiras, e os resultados dos testes realizados em gestantes mostram a prevalência dessas doenças nas mulheres, nos locais estudados.
12 Ter adquirido 10 milhões de preservativos femininos.
Resposta: A última aquisição de preservativos femininos foi de 4 milhões de unidades, sendo que não houve compras anteriores.
Segundo Nair, o processo de criação do plano começou em 2005. “Era para ser um plano integrado, inaugurar o marco em integrar políticas, além de contar com parceria técnica e financeira. A área de aids sempre sonhou com isso, mas nunca aconteceu de fato.” Para ela, o plano não passou de um “show político”. “Nunca houve um orçamento específico e nenhum dos parceiros foi responsabilizado. Toda vez que há um interesse político, o plano reaparece”, complementou.
Jenice Pizão, integrante do movimento das Cidadãs Posithivas, fez as mesmas críticas. “Não tem orçamento, isso é o grande nó. Além disso, na última enquete rápida das cidadãs, nos 27 estados, cerca oito participaram das discussões sobre a epidemia entre mulheres. Mesmo assim, elas tiveram dificuldades para contribuir. Os gestores locais não foram sensibilizados”, contou.
A ativista também foi questionada que nota atribuiria à execução do plano em andamento desde 2007. “É três. As parcerias deveriam acontecer. Não sei se isso é falta de verbas ou se os gestores não percebem a gravidade da aids”, comentou. Na opinião dela, um dos motivos é falta de capacidade técnica. “Em questões locais, os gestores de aids, principalmente os municipais e alguns estaduais, são políticos e não têm capacidade técnica. Esse é um dos grandes problemas quando se pensa em descentralização de políticas públicas, por isso minha nota é baixa.”
Já a militante Jussara Portugal, ativista da ICW Latina (Comunidade Internacional de Mulheres) no capítulo brasileiro, elogiou o plano. “Tivemos diversas ações no ano passado, principalmente as reuniões macro-regionais como implantação de política pública. O plano está dentro das metas de políticas públicas de mulheres e contempla o que nós queremos enquanto mulheres”, disse.
No entanto, segundo ela, falta divulgação para as pacientes sobre a existência do documento. “Nós precisamos nos capacitar mais para ampliar o conhecimento desse plano na ponta para fazer um controle social maior”, disse.
A única ressalva feita pela ativista é que as ações do plano focalizam bastante as mulheres em trabalho de parto. “Temos que ter políticas de saúde integral, independente das mulheres serem gestantes”, finalizou.
Colaboração: clipping Ben Fam(08/0/0100
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