Parcerias sexuais múltiplas, baixo uso do preservativo e mitos culturais levam a África do Sul ao topo mundial da epidemia de aids
11/06/2010
O país sede da Copa do Mundo de Futebol de 2010 é um dos mais afetados pela aids. Aproximadamente uma de cada cinco pessoas sexualmente ativa vive com HIV na África do Sul.
Se o estádio Soccer City, onde a seleção sul-africana estreia a Copa contra o México nesta sexta-feira estivesse com sua capacidade máxima de 88 mil pessoas completa por adultos, 16 mil seriam portadoras do HIV, segundo as estatísticas.
Dados do Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV e Aids (Unaids) indicam uma soroprevalência na África do Sul de 18.1%. Entre as mulheres grávidas, é ainda maior: 29%.
O país tem uma variação significativa na soroprevalência por província, variando de 39,1% em KwaZulu-Natal para 15,1% em Western Cape.
As parcerias sexuais múltiplas e concorrentes sem o uso constante do preservativo estão entre os principais fatores de propagação do vírus. “É muito comum na África do Sul que homens e mulheres tenham relações extraconjugais durante vários meses e anos, criando assim uma grande corrente de transmissão do vírus”, explica a pesquisadora Sue Goldstein, do Instituto Soul City, um projeto multimídia de promoção da saúde.
Nas zonas rurais, onde vivem cerca de 40% da população, mitos também contribuem para o aumento da epidemia. Não são raras as falsas histórias de que a aids poderia ser curada através da relação sexual sem preservativo com uma pessoa virgem.
Resposta governamental
Quando Nelson Mandela, principal líder africano, assumiu a presidência do país, cargo que ocupou de 1994 a 1999, o combate a segregação racial era prioridade máxima.
Seu sucessor, Thabo Mbeki, entretanto, se recusou a iniciar uma política de tratamento com antirretrovirais. Mesmo com a vitória histórica do governo, em 2001, contra os 39 laboratórios que tentaram se opor a uma lei que facilitava a entrada de genéricos no país não mudou o acesso aos remédios antiaids.
Mbeki, no poder entre 1999 e 2008, escutava os defensores de uma teoria de que o HIV não é a causa da aids. Auxiliado pela sua ministra da Saúde, Manto Tshabalala-Msimang, ele afirmava que os antirretrovirais eram mais perigosos que a própria doença e chegou a indicar batatas africanas como o melhor método de tratamento. As campanhas feitas por organizações da sociedade civil, como a Treatment Action Campaign, não conseguiram fazê-lo mudar de ideia.
Mas em abril deste ano, o atual presidente, Jacob Zuma, lançou um audacioso plano nacional contra a epidemia, que pretende realizar, até 2011, testes de HIV em 15 milhões de pessoas, contra 2,5 milhões em 2009, e fornecer o tratamento com antirretrovirais a 1,5 milhão de pessoas, contra cerca de 1 milhão no ano passado.
Presente no lançamento dessa iniciativa, o diretor executivo da Unaids, Michel Sidibé, declarou: “A África do Sul pode destruir a trajetória da epidemia causada pelo HIV”.
Com várias atividades voltadas à mudança de comportamento e o aumento de pessoas tratadas, a epidemia na África do Sul mostra uma pequena redução nos últimos anos.
Dados do Unaids apontam para um declínio significativo entre os jovens com idade inferior a 20 anos, cuja prevalência foi de 13,7% em 2006 comparado a 15,9% em 2005.
Apesar dos avanços, o país ainda tem como maior desafio a mudança de hábitos tradicionais que propagam o vírus. Zuma, o mesmo presidente que lançou o audacioso plano contra a aids e foi a público fazer o teste de HIV, admitiu em 2006 ter mantido relações sexuais sem camisinha com uma mulher com HIV e afirmou ter tomado banho depois do ato, acreditando que isso reduziria o risco de infecção.
Aos poucos, a África do Sul busca mudar o triste cenário da epidemia de aids, mas a mudança de comportamento da população, segundo especialistas, ainda levará muitos anos para se adaptar ao mundo com HIV.
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