Estado laico até que ponto? (artigo)
30/09/2010
Congresso em Foco
Roseann Kennedy
O que vou dizer a seguir está na Constituição: “O Estado é laico”. Mas o temor de perder um voto aqui e outro ali faz com que os presidenciáveis adotem posturas nessas eleições que nos provocam dúvida sobre o real poder que a Igreja tem nas decisões de governo.
Não me surpreende o fato de os candidatos buscarem a simpatia do eleitor, independentemente de seu credo. Afinal, o Brasil tem uma diversidade religiosa que deve ser motivo de orgulho. Ter católicos, evangélicos, judeus, muçulmanos, espíritas ou integrantes de cultos de origem africana convivendo sem problemas é algo que ajuda na nossa nacionalidade, na nossa cultura, mostra nosso espírito democrático e nossa tolerância com as diferenças.
No entanto, quando além do convívio e da busca de votos nesses segmentos, o candidato passa a assumir compromissos para não agredir o pensamento de correntes religiosas, eu acho grave. Porque se trata de abrir a porta para uma interferência que a Constituição não permite.
Nesta quarta-feira, por exemplo, a candidata do PT, Dilma Roussef, reuniu-se com um grupo de representantes das igrejas católica e evangélicas. Disse a eles que pessoalmente é contra o aborto, embora seu partido defenda a proposta. Também disse que jamais usaria o nome de Cristo em vão e negou ter dito que nem Jesus Cristo tiraria dela a vitória nesta campanha.
Mas, na tentativa de cessar boatos que circulam na internet sobre esses temas-tabus para os religiosos, Dilma terminou assumindo um compromisso público com o grupo. Disse que, se eleita, não enviará ao Congresso proposta para legalizar o aborto. Que isso não passará pela Presidência.
Como assim? E se houver um encaminhamento de alguma pasta como o Ministério da Saúde para que a Casa Civil analise proposta nesse sentido? E se partir alguma sugestão do gênero da Secretaria Especial de Política para as Mulheres? Daí, eleita, a presidente diria: o Estado não pode enviar a discussão para o Congresso porque a Igreja não quer?
Não quero aqui levantar nenhuma bandeira a favor ou contra o aborto. O que acho que é padres e pastores podem até ser militantes, mas não pode a Igreja interferir no Estado de forma alguma.
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