Chamem a ONU! (Crônica de hoje, no caderno especial do Rock in Rio)
(Publicada no Segundo Caderno especial Rock in Rio. Outra crônica foi publicada no caderno regular, também reproduzida aqui no blog)Prezado e persuasivo empresá-
rio Roberto Medina: ligue para
o secretário-geral Ban Ki-moon
e proponha a transferência
imediata da 66(6?) Assembleia
Geral da ONU de Nova York pa-
ra a Cidade do Rock. Só assim a paz efetiva
entre palestinos e israelenses será alcança-
da. Para começar, o clima aqui neste des-
campado, por mais cheio que esteja de gen-
te, é desértico: de dia, faz um baita calor. À
noite, é um frio da trolha.
Em segundo lugar, a área está cheia de
tendas e assentamentos temporários. Em
terceiro lugar, Milton Queen Mercury Nasci-
mento clamou: “Love of my life, can’t you
see?”, em meio ao foguetório de artifício, em
feliz alusão casual metafórica e serendipito-
sa aos foguetes e às bombas trocadas dos
dois lados das fronteiras.
Não é só isso. A Cidade do Rock é uma
terra onde utopias se realizam efetivamen-
te. Por exemplo: o milagre da multiplicação
de cabines nos banheiros femininos. Nunca
antes na história de um evento as filas de
fêmeas desesperadas estiveram ausentes.
Confesso que até fizeram falta.
Em compensação, o banheiro masculino
ainda ecoa tempos imemoriais e selvagens:
um urinol quilométrico ao ar livre deixa de-
sabrigados e devassáveis os pombos da ra-
paziada. E, como se sabe, pombo com frio é
sempre uma ameaça à paz e ao amor.
Além disso, são duas, apenas duas, as
pias masculinas. Não deixa de ter lá a sua
simbologia cívica: é o reconhecimento táci-
to do direito do homem de não lavar as
mãos, reivindicado na forma de hábitos cul-
turais que atravessam os séculos. E reco-
nhecimento é a palavra-chave de ordem pa-
ra que qualquer negociação avance.
Se faltam pias, água não falta: os chafari-
zes espalhados pela arena são capazes de
resolver o problema de recursos aquíferos
que maltrata o Oriente Médio. E, da mesma
maneira como Israel fez
crescerem lavouras no
deserto, Medina fez sur-
gir do árido solo de Jaca-
repaguarra (ou será Bar-
rarepaguá?) um verde-
jante gramado de plásti-
co sobre o qual pés des-
calços celebram a alegria
de pisar.
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