Em tempos tão difíceis para prevenção vemos este tipo de banalização da aids.
Marcos Moreira
O
assunto já foi abordado aqui em nossa primeira reportagem exclusiva,
“Além do Escândalo: o Mundo do Sexo sem Camisinha”, assinada pelo
jornalista Bruno Machado, nosso colaborador. Mas agora a controvérsia
acerca daqueles que têm fetiche por soropositivos ou pelo risco de serem
contaminados pelo HIV ganhou mais um capítulo que envolve a indústria
da pornografia.
Trata-se
do filme “Carga Viral”. Você vai saber mais sobre ele no texto abaixo,
escrito pela jornalista Tracy Clark-Flory e traduzido do site Salon,
cujo título original é: “Quando o HIV é excitante.”Minha opinião está no fim da entrevista.
*********************
Há
um frasco de líquido branco. Nele estão escritas as palavras, “POZ CUM”
(esperma soropositivo, em tradução livre). O conteúdo é despejado
diretamente em um dos orifícios da estrela pornô Blue Bailey – um
orifício que não é sua boca.
Esta
cena do novo filme de Treasure Island Media , “Carga Viral”, está
alimentando uma polêmica até mesmo na indústria pornô hétero, que tem
sistematicamente abolido o uso de preservativo em suas produções. É a
primeira vez que um filme pornô mostra declaradamente o HIV e o risco de
transmissão do vírus.
O
release do filme diz o seguinte: “Mansex é um vírus que usa os homens
como seu hospedeiro. Alguns tentam resistir. Outros o adotam como fonte e
significado de vida. Reproduzimos o vírus para passá-lo a cada anônimo
aleatório que encontrarmos para foder. É assim que ele se reproduz.”
Sobre os coadjuvantes de Bailey, o material de imprensa diz: “A maioria é
de soropositivos, alguns são negativos, mas quem se importa?”
Um
blogueiro da indústria do pornô, Mike Sul, escreveu sobre o novo filme
com o seguinte título: “E você pensou que pornô hétero era sujo…” Outro
post, do
STR8UPGAYPORN opinou:
“Treasure Island Media não é mais um estúdio de pornografia gay, não é?
Agora, o seu modelo de negócio é 100% focado em propagação de doenças
infecciosas.” Ele acrescentou que a empresa de produção “está no negócio
de terror e morte (o que é uma coisa estranha de imaginar que pessoas
usem para se masturbar)”, e comparou a produção a um “snuff film”
(filmes que mostram mortes ou assassinatos reais de uma ou mais
pessoas).
O
caso é que Bailey é HIV positivo; ele não é um performer HIV negativo
sendo exposto à ejaculação de um soropositivo. No entanto, é
teoricamente possível que ele possa contrair uma superinfecção de outras
formas de HIV resistentes à medicação que ele toma ou ainda outras
doenças sexualmente transmissíveis entre as atividades que pratica em
“Carga Viral”.
O que eu me
perguntava era: se Bailey inventara este risco para o filme, a
controvérsia em torno e fetichização do HIV (e talvez a atração pela
ideia de – mesmo que não real – da transmissão do vírus). Telefonei para
ele para descobrir.
O que você acha da polêmica sobre o filme?
Eu
pedi para estar no vídeo. O frasco de esperma era a ideia deles, mas,
para mim, não estava impondo qualquer risco para a minha saúde, porque
eu sou HIV positivo e um frasco de esperma não ia mudar isso ou afetar a
minha saúde de qualquer forma. Para mim, isso não parece ser uma
controvérsia. Claro, houve sensacionalismo, mas não estava afetando
minha saúde. Acho que Treasure Island pode ter deixado de mencionar o
meu status de propósito para talvez “hypar” o filme.
Você tem qualquer preocupação em contrair qualquer outra DST?
Isso
é sempre um risco ao se fazer sexo, então, em algum nível, há uma
chance de que possa acontecer, mas eu faço exames com bastante
frequência . Eu fui testado antes do filme e depois.
Algumas
pessoas vão ficar escandalizadas ao descobrir que há pornografia que
fetichiza o HIV. O que você diria a eles, como você explica isso?
Primeiro:
o filme pode ter sido feito para um público que já está buscando isso e
que já pode ser HIV- positivo e isso é apenas uma representação de como
eles fazem sexo em sua vida cotidiana. Outro aspecto poderia ser que há
pessoas que irão ver isso por serem HIV negativos e por gostarem de
fantasiar sobre isso, se masturbar vendo isso, mas não necessariamente
participar disso. Essa é uma forma para realizar uma fantasia sem
realmente ter comportamentos de risco.
O ator pornô Blue Bailey
Eu certamente acho que eles deixaram de mencionar para as pessoas falarem disso.
Você sente que seus filmes devam ter alguma responsabilidade no sentido de dar um exemplo de sexo seguro?
Em
primeiro lugar, eu não acho que a pornografia tenha de dar exemplos.
Não é um vídeo educativo. Para mim, pessoalmente, como alguém que é
abertamente HIV positivo, estou informado sobre minhas decisões,
comunico a meu parceiro sobre o meu status e eu acho que nesse aspecto
estou sendo responsável nas escolhas que eu faço.
Os
estúdios em que trabalho, mesmo quando as pessoas não fazem exames e
praticam sexo sem camisinha, falam com os atores sobre os riscos. Se
rolar uma transa entre positivo e negativo, ambos estarão cientes;
geralmente o ator positivo tem carga viral indetectável, o que reduz o
risco de transmissão.
Você filma principalmente sem preservativos?
Eu faço os dois, mas eu diria que a maior parte do trabalho que eu faço é sem preservativos.
E você trabalha com modelos que são soronegativos?
Eu já trabalhei com HIV negativos, tanto com quanto sem camisinha.
O filme parece fetichizar o HIV, talvez até mesmo o risco de transmissão. Por que é sexy para alguns homens gays?
Essa
é uma pergunta difícil, porque eu não quero falar em nome de todos. A
única coisa que posso pensar é que, talvez, alguém que seja negativo se
envolve em sexo sem proteção pelo medo da contaminação ou, talvez, eles
já estão positivos, e o medo não está mais lá. Esse tipo de pensamento
no entanto é um pouco desatualizado, porque hoje é possível fazer aquele
tratamento pós exposição e continuar a fazer a mesma coisa sempre sem
se proteger.
***********
Sem
moralismos, acho que a ideia do sexo sem camisinha foi bastante
demonizada após a Aids, mas sabemos todos, não sejamos hipócritas, que
quase todo mundo prefere o sexo sem preservativo, NÃO APENAS OS GAYS.
Filmes pornográficos heterossexuais cada vez mais têm produções em que o
sexo sem proteção é o personagem principal. Também nunca se discute
como e em que circunstâncias um casal pode abolir o uso da camisinha. É
um discussão necessária, afinal, se todos transassem apenas com
preservativo, não haveria mais bebês, até a igreja católica sabe disso.
Também
sabemos que o sexo sem preservativo está cada vez mais comum entre os
gays, que após o coquetel de medicamentos antirretrovirais pararam de
ter medo de morrer de Aids. Em nosso último programa, (LADO BI N° 51 – SOROPOSITIVOS)
discutimos como a vida com HIV não é assim tão simples, embora, isso é
fato, poucas pessoas morrem de Aids hoje em dia. Mesmo assim, nos
Estados Unidos, em minha última viagem, descobri que há a figura do “poz
friendly” (um cara soronegativo que não liga de transar com
soropositivos, com ou sem proteção). Sim, há o fetiche pelo risco e isso
não envolve apenas o HIV. Muita gente curte transar em locais públicos,
por exemplo, pelo mesmo motivo. O medo excita.
Sobre o filme, coloco aqui o link do trailer para que vocês avaliem.
Confesso que fiquei muito excitado de ver as cenas de trepada. Até o
momento em que aparece o pote de esperma contaminado. Achei totalmente
broxante e mega nojento, mas antes que algum canalha de plantão venha
dizer que nós gays somos promíscuos e escrotos, vale lembrar que,
segundo a OMS, toda pessoa que teve mais de dois parceiros por ano é
considerada promíscua. E quanto ao filme ser nojento, RECENTEMENTE VI UM
FILME PORNÔ HETERO EM QUE DUAS ORIENTAIS TRANSAVAM COM UMA LULA VIVA
(procure por “squidpussy” no Google). Pelo menos em “Carga Viral”,
segundo o depoimento do Blue Bailey, todo mundo está ciente do que está
fazendo.
Também concordo
quando o ator diz que pornô não é para educar ninguém, embora é fato
que muitos de nós tenhamos, em alguma medida, sido educados sexualmente
pelos filmes pornográficos, conforme discutimos no LADO BI N° 22 – PORNOGRAFIA. Talvez
por isso os filmes pornográficos devessem ter um aviso sobre os riscos
que cada pessoa tem ao tentar imitar o que se passa ali. Alguns deles
têm, mas ainda é pouco.
De
qualquer modo, não deixa de ser corajoso retratar isso em um filme,
pois sabemos que essas práticas existem e estão cada vez mais difundidas
entre gays e héteros, com a diferença que nenhum filme hétero até agora
falou do assunto abertamente.
__._,_.___
Nenhum comentário:
Postar um comentário