O que fazer com traficante dependente?
24/01/2011
Diário do Grande ABC
A passagem relâmpago do advogado Pedro Abramovay pela Senad (Secretaria Nacional Antidrogas) reacendeu o debate sobre políticas para tratamento de dependentes químicos que passam a traficar drogas, sem envolvimento com o crime organizado, para manter o próprio consumo. Para especialistas ouvidos pelo Diário, um tratamento eficaz para os chamados pequenos traficantes é crucial na sua recuperação e a consequente redução da criminalidade.
Abramovay pediu demissão sexta-feira do cargo de secretário nacional de Justiça e recusou indicação para Senad depois de ser desmentido, no início da semana passada, pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. O advogado defendeu, na mídia, a substituição da pena de prisão para pequenos traficantes por penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade, para resolver a superlotação carcerária. Segundo ele, dos atuais 70 mil presos por tráfico, 40 mil podem ser enquadrados nesse perfil.
No entanto, afirmam médicos e profissionais ligados à Justiça, substituir uma pena pela outra em nada vai adiantar. Pelo contrário, vai gerar sensação de impunidade. "É preciso programas eficientes de tratamento, geração de emprego, formação para tirá-lo do tráfico e fazer com que não volte a cometer. No País, a reincidência chega a 70%. O tráfico é onde mais o indivíduo volta a cometer o delito por ser dependente, não ter renda, estrutura familiar e escolaridade", ressalta o juiz Ulysses de Oliveira Gonçalves Júnior, titular da 1ª Vara de Execuções Criminais de São Paulo e corregedor dos Presídios da Capital.
A psicóloga Andréa Costa Dias, especialista em dependência química, chama a atenção para a falta de informação sobre os dependentes químicos, o que fazem e quantos são. "Há um desconhecimento sobre perfil e hábitos do dependente, principalmente de crack. Muitos conseguem levar vida social com trabalho e relacionamento", explica.
Andréa coordenou estudo que analisou 107 dependentes de crack que estavam em tratamento no Hospital Geral de Taipas, Zona Leste da Capital, entre 1992 e 1994. Doze anos depois, retomou o contato com eles e descobriu, a partir de entrevistas, que 61% se envolveram em delitos. Destes, 29% com o tráfico.
Além disso, 43% foram presos pelo menos uma vez, com média de tempo de prisão de um ano e oito meses. Já a média de tratamento foi somente de três meses. "Isso é reflexo da política repressiva em relação a essas pessoas. São doentes crônicos e é preciso mudar o olhar sobre a questão", diz.
É esperado nos próximos meses o primeiro diagnóstico sobre o tema, feito pela Fundação Oswaldo Cruz, a pedido do governo federal. Além de não saber quem são, o Ministério da Saúde desconhece quanto custa o tratamento para dependência química no SUS (Sistema Único de Saúde).
A psiquiatra Ana Cecília Marques, da Uniad (Unidade de Pesquisas em Álcool e Drogas), da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que há 25 anos trabalha com pesquisa e tratamento sobre o tema, vai mais longe. Para ela, nem a Justiça nem a Saúde Pública estão preparadas para encaminhar e atender os pacientes. Ela lembra que há 40 anos a Organização Mundial de Saúde declarou se tratar de uma doença como qualquer outra. "Ou seja, a Constituição já garante o tratamento público a eles. Mas faltam profissionais capacitados, leitos e locais apropriados", critica a médica, que é favorável ao fim dos manicômios, mas lembra que a internação adequada em alguns casos é o mais indicado.
Cortesia: Clipping Bem Fam
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