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sábado, 27 de março de 2010

DIÁRIO DO NORDESTE - CE | CADERNO 3 AIDS 26/03/2010

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DIÁRIO DO NORDESTE - CE | CADERNO 3

AIDS

26/03/2010

A vida mítica de Renato

Amanhã, o carioca Renato Russo chegaria aos 50 anos. Líder da Legião Urbana, o cantor e letrista se mantém como um dos principais ídolos da juventude brasileira. Data será marcada por lançamento de CD

Tornar-se um mito, cada vez mais distante de uma existência real, parecia um destino certo para Renato Manfredini Júnior (1960 - 1996). Celebrizado como Renato Russo, líder da Legião Urbana - uma das principais bandas do cenário roqueiro nacional nos anos 80 -, o cantor e compositor foi o porta-voz favorito de incontáveis pessoas que viveram a adolescência entre 1984 e 1996, entre o lançamento do primeiro disco da Legião e a morte de Renato, em decorrência da AIDS.

Quem tem menos de 40 anos certamente deve ter conhecido algum colega (senão a si mesmo) fã da Legião, daqueles que sabiam as letras na ponta língua, que escreviam os versos melancólicos e raivosos de Renato no caderno, que viam ilustrados naquelas canções o sofrimento da juventude, o desconforto, a sensação incômoda de não ser suficientemente entendido ou amado. Renato era visto como um profeta. Colegas de geração tão talentosos quanto ele, caso de Herbert Vianna e Arnaldo Antunes, nem de longe estabeleceram esta relação de devoção com os fãs. Só Cazuza, desta mesma época, vitimado pelo mesmo trágico fim, também foi visto como modelo, guru e voz interior de tanta gente.

Memórias e bugigangas

Amanhã é aniversário de Renato Russo. O cantor, que morreu aos 36 anos, tornaria-se um cinquentão. (Difícil imaginá-lo no palco, com esta idade, cantando o desconforto juvenil). Em vida, lançou sete discos de estúdio com sua banda; outros dois, solo. Hoje, Renato Russo é cada vez menos um homem e mais um mito, com uma vida repleta de mistérios e feitos fantásticos - tudo feito conforme o gosto do freguês, para garantir a devoção e novas compras. Mesmo que o produto seja de qualidade duvidosa.

O verdadeiro baú

Como era de se esperar, nestes 14 anos sem Renato Russo tem se tentado vender de tudo. A verdade é que estes adendos têm pouco a ver com o cantor. Renato foi um artista econômico - como os arranjos da Legião -, que não lançou discos em excesso e fez poucos shows, se tomada a proporção do sucesso do grupo que liderava. Lançou apenas um disco ao vivo - "Música para acampamento" (1992), os demais registros ao vivo foram editados depois de sua morte; nenhum vídeo e sequer o acústico gravado para a MTV (que só saiu em 1999).

Bem diferente deste material póstumo (ver quadro ao lado) são os indicativos de direção que ele espalhou não apenas por sua obra, mas em entrevistas e escritos. Pode-se dizer que Renato Russo foi uma excelente porta de entrada, infelizmente sub-aproveitada. Das lendas da época de Aborto Elétrico, grupo que integrou no final dos anos 1970, ainda em Brasília, tira-se a imagem de um jovem apaixonado pelo punk inglês, que sabia de cor as aventuras dos Sex Pistols. Ganhou quem partiu desta referência para uma audição de "Nerve Mind the Bollock´s" (1977), disco clássico do quarteto inglês, indispensável para compreender o espírito roqueiro do Brasil dos anos 1980.

No palco, ele repetia passos da "dança da mosca morta", estranho inventário de movimentos similares a um ataque epilético. O autor dos passos era Ian Curtis (1956 - 1980), vocalista e compositor do Joy Division, banda com a qual a Legião Urbana partilhava a simplicidade dos arranjos, climas, acordes (compare "Isolation" e "Índios") e a tristeza dos versos. Melhor que entronizar os esboços de Renato, de não deixar que ele seja apenas um homem, é aprender com ele, como se fosse aquele irmão mais velho que saca tudo de música, poesia e dor.

Coletânea

Renato Russo

Duetos

R$ 29,90

15 FAIXAS

2010

EMI MUSIC

A CARREIRA pós-morte de Renato Russo exige uma nova concepção da expressão, bem cearense, da "rapa do tacho". Um ano depois de sua morte, a família autorizou o lançamento de "O último solo", justificando que ele seria justamente isto: as raspas e restos que não apenas interessariam ao fã, mas que teriam qualidade suficiente para não desonrar o legado do cantor. De lá para cá, outros dois discos de inéditas foram lançados - "Presente" (2003) e "O trovador solitário" (2008) - recheados de demos, versões alternativas e canções incompletas devidamente concluídas em pós-produção. Sem mais de onde tirar, a EMI - dona do passe de Renato - lança "Duetos", tipo de coletânea que já virou tradição no Brasil, com exemplares dedicados a Chico Buarque, Gal Costa, Zeca Pagodinho e Cássia Eller. Para pegar o fã, que deve ter os duetos nos álbuns aos quais pertencem, a gravadora inclui uma inédita. "Like a Lover" é uma versão em inglês de "O Cantador" (Dori Caymmi e Nelson Motta), do repertório de Sergio Mendes & Brasil ´66. Ao registro original, foram adicionados vocais de Fernanda Takai. Há desde registros já conhecidos, caso de "A cruz e a espada", com Paulo Ricardo; a raridade "Só juntos", gravado com Dorival Caymmi. Estranho mesmo são os duetos "fantasmagóricos", sete ao todo, de gente do quilate de Caetano Veloso (Change Partners) e Leila Pinheiro (La Solitudine). Partes dos vocais de Renato Russo dão lugar a novos, registrados por estes "admiradores".

DELLANO RIOS

REPÓRTER

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