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quarta-feira, 9 de abril de 2014

CLIPPING Saúde, Sexualidade & Afins 08/Abr./2014

CLIPPING

Saúde, Sexualidade & Afins

08/Abr./2014



Eu já conversei com meu filho hoje, e você? (Michelle Terra)

RBA


Pesquisa aponta que 70% dos estupros relatados em 2011 vitimaram crianças e adolescentes no Brasil


Nos últimos dias não ouvi falar de outro assunto. A campanha EU NÃO MEREÇO SER ESTUPRADA esteve presente em todas as redes sociais, jornais e contou, inclusive, com o apoio da presidente Dilma.


Eu já estava refletindo sobre esse tema desde que ouvi o deputado estadual Rafael Picciani, o Dr. Nelio Andrade e o radialista Francisco Barbosa debatê-lo em um programa da rádio Tupi, há cerca de um mês. Mas o debate era outro, e eu, por ser mãe, não consegui parar de pensar naquilo. O debate discorria sobre o número de casos de estupros de crianças e adolescentes, que aumentava vertiginosamente. E percebam, o assunto não estava baseado em dados, mas sim em números de casos reportados à rádio. Diante de todo o alvoroço causado pelos dados divulgados pelo IPEA, resolvi ler a pesquisa para tentar entender o contexto, até porque, toda vez que as feministas levantam uma bandeira, minhas intuições me pedem que eu estude os fatos antes de me posicionar.


Assim que iniciei minha busca pela pesquisa, obtive dois resultados: a própria pesquisa que tem o título "Tolerância social à violência contra as mulheres" e uma nota técnica intitulada "Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da saúde". Ambas foram publicadas em março de 2014, mas apenas uma ganhou notoriedade nacional. Embora o instituto tenha causado ainda mais polêmica ao publicar uma errata sobre os dados da pesquisa, a meu ver, isso só demonstra sua seriedade e comprometimento com a verdade. Sua validade não deve ser questionada. Apesar de eu ter minhas ressalvas sobre as intenções do alarde causado em torno do assunto "a roupa que eu uso", quero deixar claro que sou a favor da campanha, que concordo totalmente que nenhuma mulher merece ser estuprada, sob nenhuma circunstância!


Não vou discutir aqui a importância desses 26% ou dos antigos 65% dos entrevistados que causaram tanta indignação ao concordarem que mulheres com roupa curta merecem ser atacadas, até porque atacadas e estupradas são palavras diferentes com significados mais diferentes ainda, mas pretendo sim me indignar com o que me causou verdadeiro espanto: mais da metade dos casos de vítimas de estupro tinha idade inferior a 13 anos de idade, desta forma, 70% dos estupros relatados na pesquisa vitimaram crianças e adolescentes no Brasil, em 2011.


Os dados apontam algo ainda mais alarmante: mais de 70% dos agressores no caso de estupros de crianças são pessoas conhecidas, ou seja: pais, mães, tios, irmãos, vizinhos, padrastos, amigos... E que 79% das agressões ocorrem dentro de suas casas.


Em sua conclusão, os pesquisadores alertam: "Em 50% dos incidentes totais envolvendo menores, há um histórico de estupros anteriores".


Em uma entrevista ao programa No Safe Place, o psicólogo supervisor do presídio americano de Utah, Ron Sanchez, que trabalha apenas com estupradores condenados, afirma categoricamente que não há nenhum padrão feminino comum que os estupradores procurem. A variedade de suas escolhas não está relacionada necessariamente à roupa que as mulheres usam ou coisas do tipo. O que o psicólogo afirma reflete uma linha de pensamento que não está isolada, como afirma o coordenador do Serviço de Violência Sexual do Hospital Pérola Byington, Jéferson Drezett, que em uma entrevista afirmou que há 20 anos não vê mulheres vestidas de maneira provocante, com roupas curtíssimas, aparecerem como vítimas de estupro. Ele ainda complementa que 70% dos casos que teve ciência ocorreram quando estas mulheres faziam atividades absolutamente corriqueiras, como ir e voltar da escola ou do trabalho, o que nos leva minimamente a analisar os números e sua causalidade com um maior cuidado.


Como pedagoga, me perturba a lembrança dos casos que tive conhecimento no exercício de minha profissão, enquanto trabalhei com menores infratores viciados em crack. E eu sei muito bem o quão destruidor é o estupro na vida de uma criança. As consequências disso podem ser: estresse pós-traumático, transtornos de comportamento, depressão, fobias, abuso de drogas ilícitas, tentativas de suicídio e gravidez. A própria pesquisa afirma que os dados são absolutamente alarmantes, uma vez que as consequências psicológicas são devastadoras. O que mais me instigou sobre essa questão foi por que deram mais atenção ao acessório de uma pesquisa enquanto o ponto central da outra não ganhou o devido destaque?


Acredito que o mais importante é o papel dos pais na observação e orientação de seus filhos. Eles devem, principalmente, estar atentos às mudanças de comportamento e humor. É possível orientá-los para a prevenção! Esteja sempre atento ao óbvio, por exemplo, se ele apresenta infecções e dores na região genital e abdominal. Observe se ele demonstra um comportamento sexual explícito ou um conhecimento sexual que não condiz com sua faixa etária de desenvolvimento. Observe a forma como ele brinca, alguns abusos podem ser demonstrados através de desenhos, onde a criança ilustra genitálias (geralmente a do agressor). As crianças que sofrem algum tipo de abuso tendem a se isolar e podem demonstrar medo de adultos de um sexo específico, se mostrar agitada ou perturbada na presença de certa pessoa, também podem apresentar preocupação exagerada com a limpeza corporal. Em casos extremos, apresentam comportamento suicida e automutilação.


É assustador saber que pessoas próximas possam ser os algozes de nossos filhos. Mais assustador ainda é saber que apenas 10% dos casos aparecem nas estatísticas, pois em geral, além do abuso, as crianças são coagidas e ameaçadas a não contarem nada a ninguém. Esse é um assunto delicado, difícil de abordar, mas conversem com seus filhos, os ensinem a cuidar do próprio corpo e expliquem que devem desconfiar se alguém tentar tocá-lo, inclusive nas partes íntimas, e que se neguem se pedirem para tocarem no próprio corpo ou no de outra pessoa. Oriente-os a gritar ou correr caso sintam-se ameaçados. Olhem, vigiem, denunciem. Isso precisa parar agora!


Esse sim é um tema que inspira a urgência de uma campanha nacional: EU JÁ CONVERSEI COM MEU FILHO HOJE, E VOCÊ?


Então está tudo bem no país do ‘estupra mas não mata’?

Correio do Brasil


Antonio Lassance - é cientista político e pesquisador do IPEA


O IPEA errou. Errou, assumiu o erro e pediu desculpas, esclarecendo:


“Vimos a público pedir desculpas e corrigir dois erros nos resultados de nossa pesquisa ‘Tolerância social à violência contra as mulheres’, divulgada em 27 de março. O erro relevante foi causado pela troca dos gráficos relativos aos percentuais das respostas às frases ‘Mulher que é agredida e continua com o parceiro gosta de apanhar’ e ‘Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas’”.


Resumindo, os dados de uma pergunta eram, na verdade, referentes a uma outra questão.


O Instituto comete erros. Não é o único. O IBGE, o Banco Central, o INEP e todos os outros órgãos responsáveis por divulgar dados, todos, sem exceção, vez por outra são obrigados a publicar erratas em suas publicações, retificando ou o número em si, ou títulos de tabelas, ou outros tipos de informação.


Embora o erro faça parte do trabalho de qualquer pesquisador, e rotinas de validação existam para diminuir sua ocorrência, o fato é que a cobrança da sociedade sobre um erro é bem vinda e deve ser enfrentada com humildade.


Para começar,  é preciso reconhecer que o erro do IPEA foi maior por conta da repercussão nacional e até internacional que o dado incorreto alcançou.


Isso caiu como uma bomba sobre a cabeça dos jovens pesquisadores responsáveis pelo estudo, que são pessoas sérias. Sempre mereceram e vão continuar merecendo o respeito pelo trabalho que realizam há muitos anos na instituição.


O erro do IPEA está corrigido. Mas e o erro de quem, desavisadamente, acha que, desfeita a troca dos números, agora está tudo bem? Não, senhoras e senhores, não está tudo bem.


Se está tudo bem, por que será que o número de estupros no país está crescendo e já superou o de assassinatos, conforme informação do mais recente Anuário Brasileiro de Segurança Pública?


Está tudo bem, então, no país do “estupra, mas não mata”? Será? Mesmo com mais de 50 mil mulheres estupradas em 2012, número mais de 18% superior ao de número 2011, agora podemos ficar tranquilos?


Detalhe: o número absurdo de estupros não considera os casos em que as vítimas deixam de relatar o ocorrido – por vergonha, por medo da reação da família, por receio de que alguém ache que elas não souberam “se comportar”.


O dado de estupros em 2013 vem aí. Quem fará a piada? Quem vai curtir com isso?


Desde que a Lei Maria da Penha entrou em vigor, em 2006, o número de agressões contra mulheres, relatadas ao serviço “Ligue 180”, cresceu 600%.


A cada hora, duas mulheres, vítimas de abuso, dão entrada em unidades do Sistema Único de Saúde. Alguém ainda acha pouco?


Está tudo bem no país que concorda que, “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”? Há quem diga: “Ora, bolas! Isso é só um dito popular, como outro qualquer”. Sim, um dito popular como “serviço de branco”. Só um dito popular?


Está tudo bem no país que acha que a mulher que é agredida e continua com o parceiro é porque gosta de apanhar?


O IPEA errou, mas quem comemora o erro está redondamente enganado.


Cúmplices da violência (Miriam Goldenberg)

Folha de SP


As mulheres são acusadas de serem responsáveis pela violência física, psicológica e simbólica que sofrem


É impossível não comentar a celeuma provocada pela pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).


O instituto afirmou, entre outros resultados, que 87,8% dos pesquisados concordam (total ou parcialmente) que "toda mulher sonha em se casar"; que "os homens devem ser a cabeça do lar" (63,8%); que "uma mulher só se sente realizada quando tem filhos" (59,5%); que "se as mulheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros" (58,5%); que "tem mulher que é para casar, tem mulher que é para cama" (54,9%) e que "a mulher casada deve satisfazer o marido na cama, mesmo quando não tem vontade" (27,2%).


As mulheres foram a maioria dos 3.810 pesquisados (66,5% da amostra). O mais chocante foi constatar que grande parte das pesquisadas concordava com frases estereotipadas, preconceituosas e violentas contra as mulheres.


Apesar das críticas à amostra, à metodologia e à forma como as perguntas foram feitas --e do fato de o Ipea ter errado e afirmado que 65,1% dos pesquisados concordam que "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas" (e não 26%, como corrigiu posteriormente)--, o acalorado debate foi importante para refletir sobre a cultura da violência existente no Brasil.


Tomara que os graves problemas da pesquisa não enfraqueçam a necessária discussão sobre a violência contra a mulher brasileira.


A realidade cotidiana de inúmeras brasileiras pode ser ainda mais preconceituosa, cruel e violenta do que aquela que foi mostrada pela pesquisa do Ipea.


É inegável que muitas mulheres ainda aceitam que um homem (ou outra mulher) controle seu corpo, comportamento, sexualidade e roupa. Aquelas que não se comportam ou não se vestem "adequadamente" são estigmatizadas socialmente, apesar de ninguém saber qual é o tamanho "adequado" da saia, do decote ou do biquíni que uma mulher brasileira deve usar para ser respeitada.


Elas são frequentemente acusadas de serem responsáveis pela violência física, psicológica e simbólica que sofrem.


Será que, após tantas polêmicas, as mulheres que endossam essas ideias preconceituosas perceberam que estão reproduzindo posturas de submissão feminina e sendo cúmplices da violência que elas também sofrem?


MIRIAN GOLDENBERG é antropóloga, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de "A bela velhice" (Ed. Record)


“O Brasil está às vésperas de uma epidemia de câncer”

BBC Brasil


No Dia Mundial de Luta Contra o Câncer, celebrado nesta terça (8), a afirmação do oncologista Carlos Barrios é menos para causar pânico – se é que isso é possível – e mais para fazer com que o País responda a um questionamento crucial para o enfrentamento da doença. “A pergunta é: ‘quanto vale a vida com câncer no Brasil’?”, questiona o médico, que é membro do Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama.


Em dez anos, o câncer será a primeira causa de morte no Brasil, consequência da detecção tardia da doença, da demora para início do tratamento e da falta de acesso à medicação avançada


57 mil mulheres devem ser diagnosticadas com câncer de mama no Brasil em 2014


O Relatório Mundial do Câncer 2014, divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o número de novos casos pule de 14 milhões em 2012 para 22 milhões em 2030. Mais de 70% das mortes pela doença acontecem em países em desenvolvimento, onde a detecção tardia, a demora em iniciar o tratamento e a falta de acesso a medicamentos de última geração explicam boa parte dos óbitos. No Brasil, em dez anos o câncer será a primeira causa de morte – hoje é a segunda, responsável por 15,6% dos óbitos, atrás das doenças cardiovasculares, como infarto e hipertensão.


Se o crescimento da incidência é um fato, o problema é a falta de estrutura para enfrentar essa epidemia, pondera Barrios. “O câncer é uma doença que pode ser curada, pode ser controlada. Nos países desenvolvidos, apesar do aumento da incidência, a morte tem caído. Aqui, crescem as duas coisas”.


Especialista: O maior desafio é tratarmos é tratarmos os cânceres comuns


Um exemplo típico é o câncer de mama. No Brasil, no ano 2000, a doença matava nove a cada cem mil mulheres. Em 2011, o número subiu para mais 11,9. Um movimento na contramão do mundo desenvolvido, em que a chance de cura para esse tipo de tumor chega a 90%. Por aqui, o porcentual é de cerca de 50%.


“O câncer daqui não é pior do que o de lá. A diferença é de que lá há diagnóstico precoce e acesso rápido a atendimento, o que não acontece por aqui”, afirma Maira Caleffi, mastologista e presidente da Femama, Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama


Quanto vale uma vida?


No Brasil, explica Maira, apesar de desde o ano passado a lei prever que o atendimento a pacientes com câncer deve ser iniciado em até 60 dias após o diagnóstico, o prazo não é cumprido no Sistema Único de Saúde (SUS), que atende a cerca de 75% da população. “No SUS, demoram 180 dias entre a detecção e o início do tratamento do câncer de mama. Imagina o que esses seis meses significam na diminuição da chance de cura.”


Isso sem contar o acesso limitado e atrasado às opções de tratamento, explica Barrios. Em pacientes com câncer de mama com metástase – que tem menor incidência, mas é muito mais agressivo -, há uma medicação específica, a Trastuzumabe, que é curativa. “O potencial remédio foi descoberto em 2005, mas a droga só ficou disponível no SUS em 2012. Nesse período de tempo, entre 5 a 6 mil mulheres morreram por falta de acesso a esse medicamento”, diz o médico.


Nesse período, Barrios afirma, os convênios foram obrigados pelo próprio governo a oferecer o tratamento com a droga, que é cara, mas as pacientes da saúde pública se mantiveram à margem. “É uma discrepância absurda. O médico deve prover prescrições diferenciadas frente a um mesmo diagnóstico para uma paciente do SUS e para uma de saúde suplementar, uma vez que o SUS não fornece o medicamento necessário?”


Sem garantia, resta à mulher procurar a Justiça, como fez Rita de Cássia, de Porto Alegre. Ela descobriu o câncer em 2012, quando tinha 39 anos. Fez a cirurgia de retirada de mama, quimioterapia e radioterapia. No ano passado, foi necessário substituir uma medicação por outra que seria a única eficaz para o seu caso, mas que não fazia parte da lista de medicamentos fornecidos pelo SUS. “Precisei acionar a Justiça, comprovar com muitos laudos e justificativas de que era a única medicação e de que eu não poderia arcar com o custo. Foi muito desgastante porque o procurador achava que era muito caro e eu morreria de qualquer forma.”


Decidir ou não investir no tratamento de Rita e de outras milhares de mulheres em sua situação, afirma o oncologista Carlos Barrios, depende de incluir todas as partes envolvidas no processo - administração pública, sociedade civil, sociedades médicas e indústria farmacêutica - para responder a um único dilema ético: "Quanto vale uma vida? Quanto estamos dispostos a investir para manter viva uma pessoa com câncer?"


O crack e a aids

Jornal do Commercio-PE


Já se disse, com alguma propriedade, que o crack é o mal do século , não só pela sua ação devastadora sobre o organismo, mas ainda pelos danos colaterais que ocasiona. Uma mostra desse cenário é a pesquisa nacional realizada pela Fundação Oswaldo Cruz, (Fiocruz) constatando que as mulheres usuárias de crack correm risco maior de contrair aids do que as não usuárias. A pesquisa é contundente: quase todas as usuárias de crack são portadoras de tuberculose e doenças sexualmente transmissíveis.

Eis aí uma questão catastrófica de saúde pública, para a qual ainda não foram definidas ações emergenciais e de médio e longo prazos com a visibilidade que o problema exige. A pesquisa não é apenas um estudo que pode ser expresso em gráfico, ou retrato de uma época, ela lança mais luzes sobre um tsunami social a caminho e desde já revela um quadro de degradação com futuro certo e sabido, em que todos viciados e sociedade em geral são vítimas.


O que agrava ainda mais o que foi posto pela Fiocruz é a evidência de que o vício do crack é um mal superior às epidemias de febre amarela e varíola que foram enfrentadas e vencidas pelo patrono da Fundação, há exatamente um século. Como se sabe, Oswaldo Cruz utilizou duas táticas bem sucedidas: mobilizou batalhões de mata-mosquitos para erradicar os focos de insetos e convenceu o governo a decretar a vacinação obrigatória. Significa dizer: os vetores foram identificados, combatidos, e ficaram, para as gerações subsequentes, as fórmulas, as recomendações e os meios necessários para controlar epidemias. Diante do crack, que batalhões estão sendo mobilizados, que vacina está sendo aplicada?


Não se pode dizer que os poderes públicos estão de braços cruzados diante desse mal do século , mas é possível levantar dúvidas sobre a dimensão e a celeridade das táticas para impedir o tsunami que se forma. O tamanho das ações não tem a visibilidade que tem o núcleo do problema, o crescimento do vício, sua expansão nos grandes centros, a transformação de terrenos baldios e ruas em focos de zumbis, brasileiros e brasileiras de todas as idades que estão excluídos da cidadania, de todos os direitos e todos os deveres sociais.


Mutatis mutandis, mudando-se o que tem que ser mudado, para um enfrentamento severo do mal deste século não seria exagero clamar-se por outro Oswaldo Cruz, com medidas tão rigorosas quanto as que ele adotou para vencer as moléstias do começo do século passado. Pois se assim não se fizer, se o problema não for encarado com rapidez e profundidade, detalhes de um grande painel mórbido como esses que a Fiocruz revelou podem se transformar em muito pouco tempo em um mal maior, para o qual os governos terão que tirar dinheiro de outras ações como mais escolas, geração de trabalho, melhoria da qualidade de vida de todos, em todas as áreas para conter essa doença social, fazendo muito mais difícil o processo de erradicação do mal.


O sofrimento dos bebês (Ruth Guinsburg)

Folha de SP


RUTH GUINSBURG, 55, é professora titular de pediatria neonatal da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo e coordenadora do Programa de Reanimação Neonatal da Sociedade Brasileira de Pediatria


Se há diálogo e os subsídios médicos são explicados para a gestante, facilitando a tomada conjunta de decisão, o desfecho pode ser menos traumático


O Brasil perde por dia cinco bebês saudáveis, sem malformações, por asfixia ou problemas relacionados ao parto. Entre 2005 e 2010, o país registrou 24.210 óbitos neonatais de bebês potencialmente viáveis, ou seja, que não eram nem muito prematuros nem muito pequenos.


Com assistência pré-natal, cuidado adequado durante o parto e presença de pediatra capacitado para atender o bebê logo após o nascimento, grande parte dessas crianças teria sobrevivido. Não há relação direta entre essas mortes e o tipo de parto ao qual a gestante foi submetida --vaginal ou cesárea. Mas há indicações objetivas para cada caso.


A gestante forçada a fazer uma cesárea no Rio Grande do Sul há uma semana oferecia riscos absolutamente não desprezíveis a seu filho e a ela mesma, caso desse à luz por parto vaginal. Bons obstetras tentam parto vaginal depois de uma cesárea. Mas depois de duas, essa alternativa é quase sempre desconsiderada. Era o caso daquela gestante. O risco de rotura uterina era real. O seu filho estava saindo da fase de termo (42 semanas), e bebês pós-maduros têm maiores chances de asfixia.


A médica que acionou o Ministério Público para garantir que a mãe fosse submetida a uma cesárea considerou que tinha o dever ético de salvar duas vidas. Ela agiu do modo que entendeu ser menos lesivo à mulher e à criança, embora essa não fosse a opinião da mulher, e a criança não tivesse autonomia para decidir.


Em muitos casos similares, parece haver um muro entre a família e a equipe médica. O diálogo é precário, e a decisão acaba não sendo embasada nas condições precisas do parto. Se os riscos são suficientemente esclarecidos, se há diálogo e os subsídios médicos são explicados para a gestante, sua família e rede de apoio, facilitando a tomada conjunta de decisão, o desfecho pode ser menos conflituoso.


A OMS (Organização Mundial de Saúde) estima que, para cuidar da saúde materna, o país precisa ter pelo menos 15% de cesarianas. Os países que registram índices inferiores a este têm mortes maternas evitáveis. É o que acontece em regiões africanas e no sudeste asiático, onde o procedimento é praticamente indisponível em condições adequadas.


A OMS avalia que, do total de partos realizados num país, 15% a 30% devem ser cesarianas. No Brasil, o procedimento é adotado em 55% dos casos no sistema público e em 80%, no privado.


É verdade que é preciso diminuir esses índices absurdos, mas o raciocínio não pode ser radical. O argumento de que cesarianas favorecem planos de saúde não é tão consistente quanto uma abordagem cultural. Um bebê cujo parto foi problemático pode ter de ficar ao menos sete dias na UTI, implicando custos mais elevados do que aquele recém-nascido que em dois dias pode ir para casa com a mãe.


No entanto, difundiu-se no país o hábito exagerado da cesárea eletiva, na qual os pais marcam a data de nascimento de seus filhos arbitrariamente. A mulher brasileira em idade fértil acredita que pode escolher como se dará o parto, quando na verdade são suas condições biológicas que deveriam determinar o procedimento. A princípio, todo parto deve ser vaginal, mas com a gestação vai se vendo riscos e benefícios.


Além da imprecisão para se calcular a idade de gestação--o que implica um risco de prematuridade evitável--, a entrada em trabalho de parto libera sinais fisiológicos que desencadeiam a maturidade de vários órgãos e sistemas do bebê, em especial do sistema respiratório.


Existem métodos para identificar se há sofrimento do bebê e se há necessidade de se realizar uma cesárea. Em casos como o do Rio Grande do Sul, o diálogo mais efetivo entre a equipe médica, a gestante, a família e sua rede de apoio permitiria um desfecho que, embora pudesse ser o mesmo em termos de via de parto, fosse menos traumático a todos os envolvidos.


Evidências científicas e direitos das mulheres (Simone G. Diniz e Priscila Cavalcanti)

Folha de SP


O caso evidencia violações do código de ética médica como a falta de consentimento da gestante sem que houvesse iminente risco de morte


Adelir, 29 anos, queria muito um parto vaginal, o que não foi possível com seus dois primeiros filhos. Desta vez, teve o apoio de uma doula, do marido e dos movimentos sociais que democratizam a informação baseada em evidências científicas e em direitos das gestantes.


Descobriu que, em outros países, uma mulher com uma ou mais cesáreas pode ter um parto vaginal, assim como as que têm um bebê sentado, como o seu, e que existem protocolos para esses casos. Descobriu que, no Brasil, a maioria dos profissionais desconhece tais protocolos e acredita que essas são indicações absolutas de cesárea.


No dia 31 de março, ela procurou o hospital, onde confirmou que o bebê estava bem, assinou um termo de responsabilidade e preferiu ter o trabalho de parto em casa. Sabia que se chegasse ao hospital antes de o parto estar avançado, seria forçada a uma cesárea. A médica que a atendeu, inconformada, argumentando com a "defesa da vida do nascituro", procurou o Ministério Público, que acionou a Justiça. Determinou-se que policiais armados buscassem Adelir em sua casa de madrugada e a conduzissem à força ao hospital para ser submetida à cesariana.


Por que o desejo de ter um parto vaginal provoca tanto horror nos profissionais de saúde e por que a enorme maioria deles adere ao modelo da cesárea de rotina? Na formação dos profissionais, assim como na cultura sexual-reprodutiva brasileira, com forte viés religioso e misógino, o parto vaginal é considerado insuportável, arriscado, danoso à sexualidade e, por muitos, primitivo, nojento, vergonhoso, indigno, a ser evitado sempre que possível.


Talvez isso explique por que no Brasil, na assistência ao parto vaginal, permaneçam procedimentos obsoletos como a episiotomia (corte da vagina), o uso de drogas para aceleração do parto sem protocolos de segurança, a manobra sobre o útero para forçar a saída do bebê, além da imobilização em posições antifisiológicas. Isso sem mencionar as várias formas de abuso e violência enfrentadas por um quarto das parturientes (e mais da metade das mulheres com aborto incompleto).


Considerando os setores público e privado, apenas uma entre seis mulheres consegue ter acompanhantes no parto conforme a lei. A falta de continuidade do cuidado e de privacidade são a regra, especialmente no setor público. Movimentos sociais denunciam: "Chega de parto violento para vender cesárea".


O caso tem repercussão internacional por expor o inaceitável desrespeito ao direito à autonomia da gestante, à privacidade, à legalidade, à não-violência e a tratados internacionais. Ele evidencia violações do código de ética médica como a falta de consentimento da gestante sem que houvesse iminente risco de morte. A juíza que concedeu a liminar irreversível o fez baseada em laudo passível de contestação.


Triste, o caso traz ao menos a oportunidade de diálogo sobre a assistência ao parto, as evidências científicas e os direitos das mulheres.


SIMONE G. DINIZ é professora de saúde materno-infantil na Faculdade de Saúde Pública da USP


PRISCILA CAVALCANTI é membro da ONG Artemis, que busca erradicar a violência contra mulheres


Brasil é o terceiro país do mundo com mais conflitos ecológicos

O Globo


Segundo levantamento global, busca por recursos naturais prejudica comunidades tradicionais Posição do país no ranking seria explicada pela abundância de projetos de infraestrutura relacionados ao meio ambiente


RIO - A exploração mineral, o desmatamento e a disputa por terras e água estão entre os maiores motivos de conflitos ambientais do mundo, segundo um levantamento internacional divulgado recentemente pela ONG Ejolt (Environmental Justice Organizations, Liabilities and Trade) e coordenado pela Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Os pesquisadores identificaram 945 casos em 78 países. Empatado com a Nigéria, o Brasil foi o terceiro colocado no ranking, com 58 casos, atrás apenas da Índia (112) e da Colômbia (77).


Os conflitos do país, segundo o Atlas Global de Justiça Ambiental, estão ligados à abundância de projetos de infraestrutura relacionados ao meio ambiente. São obras, como a construção de hidrelétricas, que dividem ativistas e empreiteiras; e o setor agrícola, cujas plantações invadem unidades de conservação.


- O crescimento da população mundial provocará uma busca cada vez mais intensa por commodities, e o Brasil, que é rico em terra, água, petróleo e minérios, será um alvo - descreve Leah Temper, coordenadora do Atlas. - E este recursos estão em terras ocupadas por indígenas, quilombolas e pequenos agricultores. Estes grupos serão os mais afetados.


Entre os conflitos ecológicos brasileiros estão episódios de grilagem para especulação imobiliária e a disputa por regiões que poderiam receber projetos como barragens hidrelétricas. São instalações que ampliam a geração de energia por uma matriz energética considerada limpa, mas que provocam alto impacto ambiental no local de sua construção.


Falhas na legislação


Apesar do processo de industrialização nacional ter catapultado nas décadas passadas, as exportações do Brasil são altamente dependentes de produtos do setor primário. Em 2012, metade dos produtos comercializados para outras nações vinham do agronegócio - carne, soja, etanol, por exemplo - e outros semiacabados, entre eles alumínio e aço bruto. O potencial econômico do campo leva extrativistas a se aventurarem em reservas indígenas.


Professor de Direito Ambiental da Fundação Getúlio Vargas, Rômulo Sampaio lembra que a exploração de commodities sempre gera disputa de interesses.


- O petróleo, por exemplo, provoca interesses nacionais, conservacionais e do mercado privado - destaca. - No campo, o problema fundiário torna o conflito ainda mais agudo, devido à desigualdade na distribuição de propriedades.


Sampaio atribui os dilemas ambientais e suas consequências sociais a falhas graves na legislação.


- Não há uma discussão sobre como lidar com os conflitos - condena. - Falta uma orientação, uma política pública. O debate só aparece na hora de implementação de cada projeto. Por isso, aumenta o número de ações no Judiciário.


A Fiocruz realiza, desde o ano passado, um catálogo sobre injustiças ambientais no Brasil. O órgão foi uma das fontes do mapeamento da UAB e, em trabalhos independentes, destaca os danos à saúde coletiva provocados pelos conflitos ecológicos. Nas grandes cidades, moradores no entorno de lixões estão sujeitos a doenças respiratórias, dengue e leptospirose.


Já a atuação da indústria em áreas próximas a rios leva à alteração do ciclo reprodutivo da fauna, a doenças cardíacas e à insegurança alimentar.


- Analisamos denúncias de problemas de saúde causados por conflitos ecológicos, como a contaminação de rios por agrotóxicos - revela Marcelo Firpo Porto, professor do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da Escola Nacional de Saúde Pública. - As doenças estão ligadas à degradação dos ecossistemas.


Em seu novo mapeamento, a Fiocruz já identificou 450 casos de conflito ecológico no Brasil.


- Levamos ao mapeamento da UAB os casos mais emblemáticos, relacionados ao comércio internacional - conta. - Mas conhecemos muitas outras ocorrências, de âmbito regional ou nacional.


No Rio, por exemplo, a Zona Oeste registra dois casos que seriam atentados à justiça ambiental. O polo industrial de Santa Cruz já provocou emissões de uma poeira de ferro e carbono, que causa danos ao aparelho respiratório.


Na Barra da Tijuca, moradores de comunidades vizinhas à Vila do Autódromo são ameaçadas de remoção devido à especulação imobiliária. A região receberá instalações para os Jogos Olímpicos. Segundo a Fiocruz, alterações já realizadas pelo assoreamento de recursos hídricos no local pioram a qualidade de vida da população.


Para Sampaio, as comunidades urbanas e rurais têm em comum a falta de mobilização, que permite a sobrevivência de problemas seculares.


- Não existe uma organização social entre as comunidades menos favorecidas, o que prejudica sua representatividade - assinala.


Leah, que está à frente da organização do Atlas, reconhece que o mapeamento ainda tem um longo caminho para percorrer. Nesta primeira edição, o trabalho contou com a adesão de 23 universidades e ONGs de justiça ambiental de 18 países.


'Dívida ambiental'


O levantamento não chegou a regiões expressivas do planeta, como a China, a Ásia Central e o Oriente Médio.


- Temos muitos lugares em branco no mapa - reconhece. - Mas, agora que ele é público, vamos convidar pesquisadores e ativistas dessas regiões para documentar outros conflitos e expandir o nosso conhecimento.


A coordenadora do Atlas, no entanto, assegura que a iniciativa já confirma um padrão histórico.


- O Hemisfério Sul continua suprindo as nações desenvolvidas com manufaturas de baixo preço e pagam um alto preço ecológico. As nações ricas têm uma "dívida ambiental" - analisa.


MPF pode investigar planos (Cláudio Humberto)


O Ministério Público Federal (MPF) avalia abrir inquérito sobre contrabando na Medida Provisória nº 627, um primor da bandalha nacional que livra os planos de saúde de pagar multas por descumprimento de contrato. Com a mudança, a operadora que comete de duas a 50 infrações semelhantes, pagará multa correspondente a apenas duas. E fica dispensada de corrigir a atitude, cruel e criminosa, de ignorar contratos.


O MPF terá de pedir licença ao STF para investigar a suposta tramoia: o relator da MP 627 foi o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Agora, de 51 a 100 descumprimentos de contrato pelos planos de saúde, eles só terão de pagar o correspondente a apenas quatro infrações. Relatório recente da ANS mostra que de janeiro a agosto de 2013 apenas 20,7% das multas aplicadas a planos de saúde foram pagas. Como é frequente nesse tipo de esquema, o contrabando de planos de saúde foi incluído em MP de outro tema, para não chamar atenção.


Marco Feliciano concede entrevista à revista Playboy


Ele falou que antes de se converter chegou a experimentar drogas e também comentou sobre sexo anal

 


O deputado federal pastor Marco Feliciano concedeu uma entrevista para a revista “Playboy” falando de temas polêmicos: drogas e sexo.


O parlamentar evangélico contou que na adolescência experimentou drogas. Tentou fumar maconha, mas se engasgou. “Eu tentei maconha, mas engasguei, nunca consegui fumar nem cigarro”, disse ele.


Por outro lado ele experimentou cocaína. “Conheci a cocaína nos bailinhos, no fim dos 12 anos”, afirmou Feliciano que se tornou evangélico meses depois.


O deputado conta que sonha ser presidente do Brasil. Além disso, critica a ex-senadora Marina Silva. “Marina Silva é um engodo. Com aquele jeitinho de cristã, a roupa de crente, ela foi muito inteligente.”, disse.


A entrevista na íntegra só está disponível na versão física da revista de abril que acaba de chegar às bancas, mas a coluna F5, da Folha de São Paulo, destacou algumas falas do pastor.


Além de drogas, Feliciano também comentou a respeito de sexo anal, ele precisou responder se considera possível que um homem tenha prazer com a prática.


“Com certeza, tem homens que têm tara por ânus, sim”, disse. “Eu não entendo muito dessa área porque nunca fiz, graças a Deus”.


Na visão do deputado, quem pratica sexo anal não consegue mais voltar. “Espero nunca fazer, porque parece que quem faz não volta mais”.

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